Entre os tesouros arquitetônicos e as praças históricas de Verona, nenhuma atração captura a imaginação dos visitantes como a célebre Casa di Giulietta. Localizada em um pequeno pátio acessível através de uma passagem arqueada na Via Cappello, a poucos passos da animada Piazza delle Erbe, esta residência medieval tornou-se o epicentro romântico da cidade. 

A Casa da Julieta representa o perfeito exemplo de como uma obra literária pode transcender as páginas e materializar-se no espaço urbano, transformando um edifício comum em um santuário dedicado ao amor ideal. Por mais que os guias turísticos a promovam como imperdível, muitos viajantes se perguntam: afinal, a fila e o inevitável tumulto valem realmente a pena?

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Shakespeare e Verona: uma história de amor literário

A conexão entre “Romeu e Julieta” e Verona é fascinante, embora baseada mais em ficção que em realidade histórica. Shakespeare nunca visitou a cidade italiana, inspirando-se em contos anteriores, principalmente na novela “Giulietta e Romeo” do italiano Luigi da Porto (1530). Essa narrativa, por sua vez, foi inspirada em histórias de famílias rivais veronesas (os Montecchi e Cappelletti) mencionadas brevemente por Dante na Divina Comédia. 

Embora existam registros de famílias com nomes semelhantes em Verona durante o século XIII, não há evidência histórica de um romance entre seus membros. A “Casa da Julieta” foi, na verdade, propriedade da família Dal Cappello (daí o nome da rua), cuja semelhança com os Cappelletti literários inspirou sua transformação em atração turística no início do século XX. Um brilhante exemplo de como o turismo cultural pode transformar ficção em “realidade”.

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Um pátio medieval e sua arquitetura encantadora

Ao atravessar o corredor coberto de grafites amorosos que leva ao pátio, os visitantes são recebidos por um espaço íntimo dominado pela fachada gótica da Casa di Giulietta, construída no século XIII. O edifício apresenta características arquitetônicas típicas do período medieval veronês, com paredes de tijolos expostos, janelas em arco e detalhes em pedra trabalhada. 

O pátio, embora pequeno, tem um encanto inegável, especialmente quando está sem a multidão habitual. Além da casa principal, o complexo inclui outras construções históricas que formam um conjunto arquitetônico harmonioso, representativo da Verona medieval. A entrada para o pátio é gratuita, permitindo que todos os visitantes experimentem pelo menos um pedaço da atmosfera romântica, independentemente de escolherem entrar no museu.

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A sacada que inspirou gerações

“Mas, espera! Que luz é aquela que brilha através da janela?” A famosa sacada da Casa di Giulietta, embora não mencionada explicitamente por Shakespeare (que se refere apenas a uma “janela”), tornou-se o elemento mais iconográfico do local. 

Ironicamente, a sacada que vemos hoje foi adicionada apenas durante uma restauração na década de 1930, criada especificamente para satisfazer as expectativas dos turistas influenciados pelas adaptações teatrais e cinematográficas da peça. 

Construída com materiais autênticos medievais recuperados de demolições, a sacada é um exemplo perfeito de “autenticidade construída”. Não é original, mas representa fielmente o estilo arquitetônico da época. Este detalhe raramente diminui o entusiasmo dos visitantes, que fazem fila para fotografar ou ser fotografados neste palco do amor literário mais famoso de todos os tempos.

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A estátua de bronze: tradição e superstição

No centro do pátio você encontra a estátua de bronze de Julieta, criada pelo escultor Nereo Costantini em 1972. Essa representação da heroína shakespeariana tornou-se objeto de uma peculiar superstição: tocar seu seio direito supostamente traz sorte no amor. Como resultado deste ritual improvisado, o bronze naquela área específica está visivelmente polido pelo toque de milhares de mãos esperançosas, um contraste brilhante com o restante da pátina escurecida da estátua. 

Autoridades locais já tentaram coibir esta prática, chegando a substituir a estátua original (agora preservada dentro do museu) por uma réplica, mas a tradição persiste. Esta interação tátil representa perfeitamente como os visitantes desejam uma conexão física, quase mágica, com a narrativa romântica que o local representa.

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Cartas para Julieta: um fenômeno

Um dos aspectos mais comoventes da Casa di Giulietta é o fenômeno das “Cartas para Julieta”. Há décadas, pessoas de todo o mundo enviam cartas endereçadas simplesmente a “Julieta, Verona, Itália”, compartilhando histórias de amor, desamor e buscando conselhos de uma heroína literária. 

De tão comum (chegam centenas semanalmente) que passaram a ser recebidas e respondidas pelo “Clube di Giulietta”, um grupo de voluntários que assumiu a tarefa de servir como “secretárias de Julieta”. 

As paredes do corredor de entrada estão cobertas por milhares de bilhetes e cartas fixados com chicletes, fitas adesivas e até mesmo curativos (uma prática desencorajada, mas persistente).

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Multidões e melhor época para visitar a Casa di Giulietta

A pequena dimensão do pátio (cerca de 15×15 metros) contrasta dramaticamente com sua popularidade, resultando em aglomerações significativas durante a alta temporada (abril a outubro). Nos meses de verão, não é incomum encontrar filas de 45-60 minutos apenas para entrar no pátio, com tempos de espera ainda maiores para fotografar a sacada ou tocar a estátua. A experiência muda completamente durante o inverno, especialmente em dias úteis entre novembro e fevereiro, quando é possível desfrutar do espaço com relativa tranquilidade. 

As primeiras horas da manhã (antes das 9h) ou o final da tarde (após as 17h) oferecem as melhores oportunidades para uma visita mais contemplativa. Para quem busca uma experiência fotográfica sem multidões, a madrugada é praticamente o único momento de solidão garantida neste epicentro romântico.

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Verona nas telas: inspirando o cinema mundial

A Casa di Giulietta e Verona solidificaram sua presença no imaginário global através de adaptações cinematográficas que destacam a cidade. “Cartas para Julieta” (2010), estrelado por Amanda Seyfried, utilizou extensivamente locações autênticas, incluindo o pátio e o trabalho real das “secretárias de Julieta”. A adaptação de “Romeu e Julieta” (1968) de Franco Zeffirelli capturou a essência medieval da cidade, filmando em locações veronesas que incluíram a Arena romana e palácios históricos. Mais recentemente, “Romeu + Julieta” (1996) de Baz Luhrmann, com Leonardo DiCaprio e Claire Danes, embora ambientado em um cenário moderno fictício, inspirou-se na estética veronesa. 

Essas produções amplificaram o apelo turístico da casa e da cidade, criando um ciclo contínuo onde arte inspira turismo que, por sua vez, inspira mais arte, em um fenômeno visível na quantidade de visitantes que chegam com referências específicas de cenas de filmes que desejam recriar.

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O museu interior: além da fachada

Para quem deseja uma experiência mais completa, o interior da casa funciona como um pequeno museu dedicado tanto à época medieval como à narrativa shakespeariana. 

Distribuído em vários andares acessíveis por escadas históricas, o museu exibe mobiliário autêntico dos séculos XIV-XVI, cerâmicas renascentistas e afrescos restaurados. Um detalhe surpreendentemente genuíno é a cama que aparece na adaptação cinematográfica de Zeffirelli, doada à casa após as filmagens. 

As janelas dos andares superiores oferecem perspectivas fotogênicas sobre o pátio, permitindo visualizar a estátua e os visitantes de ângulos incomuns. A sala mais emocionante para os românticos é, sem dúvida, aquela que dá acesso à famosa sacada, momento em que muitos visitantes se permitem um minuto de fantasia literária, representando a cena do balcão para deleite de quem fotografa do pátio.

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Verona além da Casa di Giulietta: vale realmente a pena?

A Casa di Giulietta representa uma curiosa intersecção entre literatura, história e turismo de massa. Para muitos, a experiência pode parecer excessivamente comercial e distante da autenticidade histórica que Verona oferece em outros monumentos. 

No entanto, há algo inegavelmente mágico em como este espaço celebra não apenas uma obra literária, mas a própria ideia universal do amor romântico, transcendendo culturas e gerações. A verdadeira magia de Verona está em sua capacidade de harmonizar essas experiências turísticas populares com autênticos tesouros históricos apenas a alguns passos de distância. 

Se você decidir visitar, vá com expectativas realistas sobre multidões e comercialização, mas também com disposição para se deixar encantar pela forma como uma história ficcional pode ganhar dimensão física e emocional tão potente. 

Você já visitou a Casa da Julieta ou planeja incluí-la em seu roteiro por Verona? Conte-nos nos comentários se prefere explorar atrações populares como esta ou se concentra em descobertas menos conhecidas durante suas viagens!

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